A avenida de três pistas
Belém
de canto a canto, fascina. A Pedreira, dentre tantos, pelo que torna, pelo que
deixa; sendo no ir ou no voltar; vendo, ouvindo e vivendo, aqui e acolá; no
frigir e no misturado dos ovos, que me perdoem os arredores, é fundamental.
É
pelo certo que, quando me volto pra cidade, dou intencionais escorregadelas e
deslizo cá, para as pedrocas. É bairro que me anima e comove.
De
justo e farto, é o bom lugar que me acolheu, ainda no seu colo bucólico, quando
acreaninho dos longes, aportei na beira da baía e vim bater aqui.
Dou
o maior valor em ser pedreirense. Aprecio o animus, o apego e a afetividade no
abraço diário que ofereço e que recebo do meu bairro.
De
termo e maneira, que faço por onde me manter renovado constantemente aos laços
que nos une. E isso, essa intimidade, eu vivencio me reconhecendo e me
reencontrando de tempos em tempos nos escaninhos, nos nichos, em meandros emotivos
do bairro. Um tempo certo é este, entre ano novo e aniversário da cidade.
E
foi o que fiz no dia 31. Programei uma manhã de reencontros, carinhos e
reencantos. Realizei o trajeto clássico. Desci a Pedro Miranda desde o Galo até
varar na Dr. Freitas. Com paradas técnicas absolutamente significativas. Entre
as referências, as batidinhas diárias que me iniciaram, ainda garoto, nesta
barra. Um reconhecimento que me recorda este apego são as, incomparáveis, três
pistas da grande avenida. Traçado viário não encontrado igual em nenhuma outra
parte da cidade. Exige até hoje atenção dos pedreirenses. Recebia a instrução
da mamãe, sempre efetiva no cuidado de atravessar a avenida. Na primeira pista,
a orientação era olhar para um lado, na última, para o outro lado e na do meio,
muita concentração: vem carro dos dois lados. Era o charme e o risco de atravessar
uma rua de três pistas. Bordando a avenida, além das mangueiras recentes e a
lembrança das antigas acácias, todo o estirão da Pedro Miranda guarda a memória
do bairro. Na caminhada, localizei, remontei em pensamento prédios já modificados,
com ligeiras lembranças das platibandas, e uns raros modelos de fachada com
azulejo no estilo ‘raio que o parta’, alguns raios, ainda hoje faiscando.
Outros
símbolos se redesenharam na imaginação. O aviamento da semana no Sandra; o aroma
do Café Século XX torrando nas tardes mormacentas; o carnaval no Pisco; As matinês
(à tarde) no Cine Paraíso; as espiadelas pelas frestas do Shangrilá; o
coadjuvante, porém jamais esquecido, Cine Vitória; A farmácia com aquele
senhorzinho farmacêutico sentado ao fundo, contando o numerário e atestando
receitas. A sede do Santa Cruz e o torneio de celotex nos sábados; e o eterno
centro de análises laboratoriais que ficava no andar de cima do Santa. Do
Santa, ou do Sandra? Agora me embananei das memórias. Eis a questão. De pé
ainda, empoderados e ativos não só no meu cocuruto, o Centro três, o Mercado e
a feira nas calçadas, a igreja de Aparecida, a igreja Batista, a clínica São
Benedito e a casa do highlander Edil. Mais para baixo, os barzinhos longevos e
malmente despintados. Os primeiros degraus da Aldeia Cabana confrontando
impressões comovidas do serpenteio que fazia o igarapé que corria nos fundos do
Josino. Foi lá, no leito do igarapé que achei o meu mais bonito e mais valioso
diamante. Além, a profusão de olhos d’água, hoje reprimidos, o pagode da
Anastácia e a Escola Salesiana. Ao fim, a aragem fagueira que vem voando do
igarapé do Zé e farfalha as matas da Aeronáutica. Naquele dia 31, fiz uma
caminhada de reencantos com Belém. E de tantos encantos, a Pedreira. Cheguei ao
final do trajeto, na baba, mas feliz. Doido pra dar um mergulho no igarapé do
Zé.
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