Joelho de vidro
Tava no
zap o convite da turma do vôlei. Respondi para me incluírem fora da próxima.
Joelho inchado. E pesarosamente vaticinei que já deu pra mim.
Das artes
do mundo que se esvaem de minhas posses, a que me dói muito, tanto no sentido
figurado quanto na vera é não poder mais praticar meus esportes favoritos por
causa do joelho bichado.
O
convite da galera para o vôlei, com este metro e meio que me define, parece até
pilhéria vã. Causa impressão de retórica resiliente. Ocorre que desde a Escola
Técnica, me enxiro. Entro no meio dos bons, dou umas manchetes de rumo certo pra
segunda bola na caté, uns saques tipo tênis indefensáveis. E me esforço como
levantador. Essas peripécias me garantiram vagas nas peladas e em alguns
torneios de reponsa outrora. Por último, brincava com a turma da rua. Só que
agora, parece que cada subida na rede é uma sessão de emigalho no joelho. Faz dois
meses que formei minha última grade para disputar dois sets e de lá pra cá, meu
caminhar ainda é manquitolado. Apesar da massagem noturna com andiroba e um
macerado de folhas várias, ainda sinto o falseio na pisada e o tufadinho
incômodo na lateral do joelho. Já deu pra mim. Custo/benefício muito alto: dois
sets mancheteando na caté para dois meses cachingando, é conta que fecha no
prejó.
Outrossim,
no futebol não tem volteios de superação não. Nem barreiras para a baixa
estatura. Dou causas justas. Declino experiências, reconhecidos méritos. O
Internacional da Mauriti. A minha quase ida para a base do Paysandu.
Naqueles
anos setenta idos, embora baixolinha, fazia e acontecia. Era época em que
aquele um mais franzino ainda tinha oportunidade de bater uma bolinha entre os
grandes. Havia sempre uma vaga nas pontas.
O
futebol profissional apontava mesmo para essa alternativa. Goleiro, zagueiro,
centro-avante eram posições guardadas para grandalhões. O meio-campo até
admitia a turma do um e sessenta. Aqui em Belém me ocorre o Alfredinho; no Rio,
o Arturzinho, ambos botando pra chulear na criação de jogadas, na meia cancha,
e devidamente mencionados no diminutivo. A maioria, entretanto, flutuava pelas
margens. Tenho lembranças do Bimbinha, Naldinho, e o grande Jacozinho que
contava com pouco além de 1,60m.
Com o
desaparecimento dos pontas, ficou vasqueiro pros liliputeanos. A competição é
feroz. As habilidades exigidas muitas; e o novo formato do futebol exige cada
vez mais envergadura. Tenho prestado reparo no Soteldo, ex jogador do Santos
que se destaca no relevo dos gramados. É habilidoso, veloz, tem visão de jogo.
Ostenta tipo físico zinho raro no futebol atual. Joga, porém, de igual pra
igual com os taludos. Me representa.
Lamento
as restrições que o joelho de vidro me impõe. Um trauma no menisco que me tirou
do Paysandu, e leva de mim, neste momento de tanta tristeza, a chance de espairecer,
de suar, de subir à rede, levantar, rodar, e sacar tipo tênis, desmontando as
defesas da turma adversária do vôlei;
Ou de
formar no time de futebol de salão do meu filho, e usar as táticas de me
esconder dos zagueiros, na banheira, explorar meu talento de chutar com os dois
pés, enganar o goleiro que pensa que bato forte, quando na verdade, bato
devagar e colocado, e correr pra galera.
Já deu
pra mim. A bola ainda me encanta, tento correr atrás dela, mas o esmigalhado empata
tudo. E então os dias se sucedem empobrecidos de graça. E se a gente tenta uma
menção, a realidade do inominável se intromete e empata tudo também. E haja
andiroba.
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