A pedra do amor
A
vinheta da novela Império, no finalzinho, exibe em destaque, um fragmento bruto
de quartzo rosa (ou diamante cor de rosa, como queiram).
O
enredo da novela é pautado na ascensão social do personagem José Alfredo,
financiada pelo comércio e industrialização de pedras preciosas garimpadas nas
alturas do Monte Roraima. Acompanhando toda a sequência da vinheta, achei
estranho o desenlace dando relevo a uma pedra que, pelo que torna e pelo que
deixa, não é tão rica de talentos e valores. Já que o império fora conquistado
com a exploração de gemas, esperava a produção mostrar peças mais clássicas no
mundo precioso das pedras como diamante, esmeralda, ametista... ou pelo menos
uma versão do quartzo mais simpática já
que, sabe-se, sem pudores o mineral faz as vezes estéticas e estilísticas até
muito bem.
Queixo-me
entender do traçado. Contando a vivência e os anos na universidade, arrisco
reconhecer em mim uma composição de 50% geólogo. Tenho também cá na minha
estante, exemplares de minerais que coletei eu mesmo com meu próprio charme, aí
pelo mundo, cada um mais enxerido de bonito que o outro. Vejo nas formas dos
minerais, no brilho, no jeito firme e sólido de aparecerem para a gente
(característica que os geólogos chamam de ‘hábito’), um encanto extraordinário.
E quem quiser experimentar o que digo, sugiro uma visita ao museu da Federal do
Pará, ao pólo joalheiro mesmo e, se quiser se deslumbrar um tantão assim, uma
passadinha no museu de mineralogia de Ouro Preto. São artes de entontecer.
Minha
admiração por pedras se dá em estado bruto. Faço parte da turma que admira as
pedras no original. E que acho ser a maioria dos geólogos que conheço. Quando mostro
estranheza à peça que é apresentada na vinheta da novela, não se trata de
preconceito com o quartzo ou uma redução no valor desse mineral. É que mesmo
aquele de estrutura mais simples tem uma amostra bem melhor que este zinho da novela.
Faltou alinhar um sentimento com a história do quartzo rosa (ou diamante cor de
rosa, como queiram). Ainda mais que, pesquisando aqui e ali, descobri que a
pedra é tida e havida, em meios alheios ao mercado de jóias e marcas, e aos
nichos acadêmicos, como a pedra do amor.
A
Geologia é ciência de várias faces. Penetra nas entranhas da Terra e desvenda
mistérios da criação, e até do futuro da criação. Explica uma série de eventos
naturais, prospecta, mede e explora bens que no nosso dia-a-dia são
imprescindíveis (e a exemplo dos metais, de uso que marcaram a História da
humanidade). Trago a Geologia dentro do meu coração. E agora, desde que meu
filho pôs a mão no canudo da graduação, partilhamos no sangue o amor por esta
área do conhecimento.
As
fronteiras da Geologia são estendidas, a sedução por notas e aplicações é vasta
(até no cinema. Se a gente reparar, dos 10 filmes de catástrofes exibidos na tela,
pelo menos 8 têm um geólogo na ação). Assim como na ficção e, meu deus! na
realidade deste Brasil atual que despreza a ciência, o geólogo é um obstinado
por apreender, entender e defender as verdades do planeta.
Ante
os fascínios da profissão, um deles é presente dentro da casa. Todo geólogo tem
um império, uma coleção de minerais, ou de pedras bonitinhas, como se diz no
popular.
Eu,
com meus 50% da graduação, tenho no meu império, uma amostra de quartzo rosa
(ou diamante cor de rosa, como queiram), sentimental e estruturalmente
habilitada a estrelar uma vinheta de novela. Amanhã, vou comemorar o dia do geólogo,
trocando olhares de caríssimos carinhos com minha pedra do amor.
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