sábado, 12 de maio de 2018

crônica da semana - premonição 2


Premonição 2
Até outro dia, tinha a impressão de ser possuidor de uma certa paranormalidade.  Na última ocasião, que ocorreu antes’donte mesmo, tive um isso pra me convencer. Só não crio uma seita ou uma irmandade de seguidores, porque há controvérsias na família. Aqui em casa a versão é que sofro de uma incontrolável patetice, com consequências inclusive, para os interesses caros da comunidade. Eu, por mim, continuo achando que é um dom. Senão, repare:
Essa semana, tive um sonho. Era uma viagem de rotina que faço de lancha nas madrugadas. Estava já com um pé embarcado, quando dei por falta da minha mochila. Instantaneamente, me vi na Mauriti (lembremos que é um sonho, e este detalhe justifica o fato de, mesmo com o trânsito caótico de Belém, e com os alagados da hora, uma viagem do porto do Veropa até a Pedreira tenha sido num pisca). Minha mochila tinha mudado de cor. Era azul-celeste, a cor do melhor do Norte. Embora modificada, a reconheci, descaída sobre o meio-fio da rua. Não pude pegá-la. O sonho, a gente sabe, não se explica. Eu tentava chegar perto, alcançar a mochila, mas não conseguia. Uma força me impedia e eu me sentia sem condições de me aproximar e resgatá-la da beira da vala. Era uma força enevoada, escondida, e tão potente, que no mesmo trisca que me trouxe para a Mauriti, me levou de volta para o Veropa, onde me vi embarcando resignado para mais um dia de lida. Sem a dita mochila do Papão.
E não é que de manhã, não sei de que jeito (a versão da família é a patetice), no caminho para o trabalho, acho que na antecâmara do soninho que a gente dá durante a viagem, ao sair do barco, deixei para trás o livro que folheio sempre para chamar um sono rápido. Na minha cabeça, jurava que tinha guardado o livro na mochila. Mas quando! Ao procurar, para dar uma lida mais apurada, na volta para casa, à tarde, quede? Lugar mais limpo.
Embora as opiniões divirjam, estava anunciada pelo meu sonho, a perda de algum tererém meu de uso naquela manhã. Não foi a mochila toda, mas foi o livro que estava dentro dela. Isso é ou não é um sinal de que sou um cara especial?
Não tem errada. Tenho poderes sobrenaturais. Preciso apenas cuidar para estabelecer meios de domar esse talento, negar ou mesmo, aceitar os traçados do destino. No caso do livro, poderia ter sido mais esperto, feito a conferência dos meus pertences, naquela manhã em atenção às dicas do sonho. Do jeito que se deu, foi uma negação.
Ocorreu uma vez, de eu repassar pra mamãe, um por um, o elenco de números que apareceu no sonho. Foi tiro e queda. Ela jogou e quebrou a banca do bicho, na extração da  Corujinha. Nesse caso foi de aceitação na risca, do destino.
Só que a gente não malda. Sonhou, tá sonhado e acabado. A gente nega por que são eventos esparsos, de pouco impacto. Não inquietam nem amofinam. Quem sabe sonhar com os números da mega-sena me faça a mim e aos meus, levar mais a sério este dom (assim, também, maluco, com milhões na conta, quem não se convence). Se eu conseguisse levitar, também seria uma demonstração irrefutável dos meus poderes. Peralá, que vou ali na laje fazer um teste.


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