Segundo tempo
Se,
daqui pra mais tarde, eu responder algum e-mail aos meus leitores, é sinal de
que sobrevivi. É que mais com pouco, vou participar de um jogo de futebol
comemorativo dos 20 anos do meu menino Argel.
Tenho
que cavucar bem cavucadinho na memória a última vez que joguei futebol. As
lembranças recentes me levam aos primeiros dias na Vila dos Cabanos. Tínhamos
uma turma animada para a bola. Após o curso de formação industrial, já além das
onze da noite, ocupávamos o campo Sangue e Areia e nos batíamos até a alta
madrugada sob os protestos dos vizinhos e da cachorrada, que à menor chance
(como se para isso ensinada fosse), abocanhava e bandava a nossa bola. Dista
dessa época a derradeira investida que fiz ao futebol jogado de vera. Embora nem
corresse atrás, ficasse de flozô na banheira, e só quisesse bola no pé. Mas se
a pelota me achasse, sabe, né, era caixa.
Depois
disso, não mais encarei pelejas adultas disputadas. A retirada de parte do
menisco, a barriguinha arqueando, e uma busca exasperante por ar a cada passada
mais ligeira, são combinações relevantes que contribuíram para que eu me
afastasse dos gramados.
Mas
a paixão pelo futebol sempre me dominou e compensei minhas vontades fazendo
pequenas participações nas brincadeiras de bola do meu filho. No início, ainda
bebê, ficava me exibindo pra ele. Mostrando como fazer embaixadinha com os dois
pés (50 sem cair), como matar a bola, domínio e direção de chute. Depois, na
adolescência era ele que me levava pra completar o time com os meninos do top
dele. Eu fazia umas firulas, dava umas carreiras, ganhava um hematoma, ficava
na baba e pedia pra sair. Aconteceu uma vez, de uns moleques que passavam pela
rua, nos desafiarem. Todos posudos, vindos dos arrabaldes, cheios de macetes.
Formamos, eu e minha patotinha. Demos um baile. De quebra, dei lambreta, chapéu
em adversário, chutei de trivela. Aguentei (só Deus sabe como) até o final da
brincadeira e só vi, no final, os adversários saindo de fininho e resmungando
que tinham perdido para um time que tinha um monte de molequinhos e um velho.
Com
essa aventura vitoriosa, na memória, Argelzinho tem insistido para me ver em
ação de novo. Quando fez quinze anos, articulou um time dos ‘amigos do papai’,
mas tudo ficou só na intenção. Por urgências outras, os amigos do papai
declinaram.
Agora,
ao completar 20 anos, Argel volta à carga. E argumenta, confiante, que olha só,
o aniversário cai num sábado. Dá pra todo mundo participar.
Pois
é. Não basta ser pai. Pesquisei entre meus contemporâneos, aqueles que estão
sem restrição médica, os que estão isentos de marca-passo ou stent e, ainda no
último critério, aqueles que ainda correm de chuva. Sobramos eu e meu compadre
Edir Gaya. Ele, que não é besta nem nada, vai de goleiro. Eu vou ter que me
aviar numas carreiras na linha. Vamos garimpar mais três e formar nosso escrete
de exibição. Daqui a pouco entro em quadra, para satisfazer o desejo do meu
rapazinho. Concentração total, só esperando o trilar do apito. Se eu fizer
contato mais tarde, é sinal que varei.
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