Do Acre ao Afuá
Parece
uma coisa. Tamanho julho e esses pampeiros no final da tarde molhando a cidade
e cortando o barato da pracinha mais com pouco. Mas tá, então, em pleno mês de
férias. Tô só vendo.
O
aguaceiro, de vera, começou no domingo. Chamou a atenção porque não foi uma
chuva comum de verão (amazônico), daquelas que se formam por causa do calorão
com nuvens pesadas e escuras. Rolou uma moldura cinza-prateada, deu-se toda uma
elaborada plástica nublada para que a água caísse.
Na
segunda-feira foi flagrante essa situação. Até chamei os meninos para o meio do
terreiro, pra gente ver aquele bailado das nuvens bem pertinho da gente,
raspando o nosso cocuruto. Uma experiência diferente para eles, ver o
ziguezaguear descompromissado do vento levando as nuvens pra lá e pra cá, numa
algazarra só, sem limites. E foi tão bacana, ouvir o farfalhar das árvores. Tão
atraente foi a anarquia do tempo d’tardinha que nos entregamos à paisagem
plúmbea, aos relâmpagos riscando o horizonte lá longe, ao vento moleque zunindo
nas esquinas. Aceitamos a bandalha da baixa atmosfera e ficamos pulando feito
menino besta, no meio da rua, querendo tocar o céu que estava logo ali. E nos
pegamos recitando exclamações extemporâneas: “éraste, parece São Paulo. Um
friozinho! As nuvens cá embaixo. Tá parece São Paulo!”.
Pode
crer, aqui na Vila dos Cabanos, foi uma das poucas vezes em que a gente dormiu sem
o ventilador rugindo de palmo em cima (depois, quando os primeiros pingos
tocaram o solo, a euforia foi se desfazendo. Nos recolhemos e ficamos olhando a
chuva da janela. E ela veio obediente, abundante, mas sem presunção ou alvoroço e assim permaneceu
durante a noite. Amiga, pertinente, aconchegante a chiar melodiosamente, no
telhado).
É
bem verdade que o aguaceiro não tem atrapalhado as férias. Acontece quando já
estamos em casa depois de mergulhos e muitas carambelas na parte rasa das
praias do Caripi e Itupanema. Mas a chuva segura a galera naquele início de
noite (quando a praça é a pedida), numa intimidade não programada. Empurra-nos
para dentro de casa, a passar o tempo jogando um dominozinho, maltratando o
violão com quadrados manjados e largando conversa fora até mais tarde. E haja
macarrãozinho instantâneo e Q-suco, pra conformar e distrair.
Agora,
quarta-feira, enquanto escrevo estas impressões (ufa, quase que sai ‘mal
traçadas linhas’), a noite lá fora, resigna-se aos respingos que ficaram da
última mini-tempestade.
Só
aí já se vão quatro dias de chuvas fortes, sempre neste horário. Se viessem
daquelas nuvens negras, densas de fim de tarde, tudo bem, ratificaria a
convecção. Mas o impacto (aprazível) na sensação térmica é que embanana a
gente.
Mesmo
porque, julho começou nos conformes. Calor forte pra chuchu. Dias encarreirados
sem uma gota de água do céu. Garrafas de água da geladeira perdendo feio para a
demanda e os vendedores de suco faturando alto nos cruzamentos da Almirante
Barroso.
Tudo
como reza o script, e de repente, quando a gente dá fé, o tempo destrambelha.
Nada
a temer, porém. Acho que foi só um resfriamento solidário. A gente não viu o
Acre, por esses dias registrando 7 graus de temperatura? (Lá também é o verão
amazônico. Daqui a pouco os rios vão estar ‘só um fiozinho correndo no rego do
açaizal’ e a imprensa vai mostrar a luta do ribeirinho sem rio por aquelas
bandas). Estas nuvens argênteas que nos envolvem, talvez sejam um resquício,
uma rebarbinha da friagem que atingiu o Acre e que veio se aquecer e se
dissipar nos ares orientais da foz do Amazonas. E nos deram noites friinhas.
Éraste, parece São Paulo!
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