Pedido pra Santa
Não
sou de pedir. Me dou, pelo comum dos anos, a agradecer. Viver já é uma graça
sem medida de tamanho ou definição. Por satisfeito, me tenho ante tantos
desafios diários. Por isso, nem conto os anos em que me programo para ver a
passagem da Santa e como tantos ao meu lado, erguer os braços em direção à
berlinda e, humilde, grato, reconhecer que nem mereço, mas que as bênçãos da
Santinha, é certo, me mantêm vivo e esperançoso de todo o bem. Já pedi, um dia?
Já. Mas eram pedidos doces. De molequinho da Pedreira.
Lá
atrás, bem longe no tempo, era apresentado. Um garoto que por tudo em quanto
recorria à Santa. Para uns casos, todo dia. Acontecia num período chuvoso, mais
de certo, com atenção àquela chuva do início da tarde. Estudava na Aparecida.
Mamãe operava a caixa registradora de uma padaria ali no largo do Museu. Não
dava descanso pra Santa. Saíamos juntos, naquela horinha morta da tarde, eu e
mamãe. Antes, enquanto salpicava um talquinho no pescoço para refrescar, rezava
a reza da hora e pedia para Nossa Senhora para não chover. Que a mamãe pudesse
esperar o ônibus, embarcar, iniciar o trabalho; que eu vencesse os dois
quarteirões até a Aparecida, tomasse a bença de fessora, me acomodasse na
carteira. Depois sim, depois que alcançados nossos destinos, abrigados e já em
nossas lidas, Nossa Senhora poderia destravar as torneiras e liberar uma
aguinha pra molhar a cidade e amainar o calor. Na maioria dos dias, não
tínhamos contratempo. Aqui ali, um chuvisco, mas nada que impactasse nosso rumo
e minha combina com a Santa.
Em
uma outra ocasião, pedi e paguei uma promessa. Acho que esse pedido deu mais
trabalho pra Nazinha, afinal tinha do outro lado, por certo, uma penca de
clamores também. Mas rolou. Papão 1 x 0 sobre o maior rival. Gol do Cabecinha.
No dia seguinte eu estava varando de lá a cá, a calçada da vila que eu morava.
De joelhos e com uma vela acesa na mão. Este bicola! Sempre nos exigindo
sacrifícios.
Depois
fui crescendo. Entendendo o mundo. Reconhecendo barreiras, degraus infinitos,
atropelos, condicionamentos sociais que dependiam mais de mim, superar, que da
Santa. A cada jornada, a cada conquista, o mínimo alcançado, posso admitir,
ainda que mesmo sem a demanda formalizada, desconfiava que a Santa dava aquela
ajudazinha. Estava escrito. Tínhamos aquela parceria que vinha da infância e não
mais precisava da formalidade das palavras em preces pidonas ou das promessas.
Desde
aquele tempo, meu encontro com a Santa é só para agradecer. Deixa estar que
este ano não. Este ano vou pedir.
De
novo, pelo Bicola (pra não cair).
E
mais, e com toda a fé, peço a intercessão da Virgem para que nossos corações
irriguem com o sangue puro e consciente, nosso cérebro. E que a lucidez se faça
presente em nossas ações. Que a gente reconheça, a partir de um avivamento da
razão, a necessidade urgente de cuidarmos do planeta, dos mais pobres, dos que
mais precisam. E que a gente perceba que ninguém se põe em pé só pela vontade.
Temos um meio social, uma distribuição de renda desigual e ainda a ganância, a
usura de muitos, que empurram qualquer vontade, qualquer sonho para o profundo
insuperável do poço e da margem social.
E
que a vida conte como nosso bem maior. Tantos são nossos conhecimentos, os
recursos tecnológicos, o poder que a ciência tem de evitar o pior. Se a vida
contasse, se contássemos com o poder do convencimento pela ciência e não pelas
fake news, como exemplo, teríamos outra conduta, preventiva, cuidadosa, ao
sinal de tanta chuva que viria atingir o Rio Grande do Sul este ano. Nenhum
outro interesse se sobreporia à vida.
Meu
pedido para a Santa é complexo, sei. Exige parceria. Tolerância. Coração
abrandado.
No
entanto, a certeza é inabalável. A Virgem vai cuidar e nos dar a graça.
Par’o’ano, estarei aqui agradecendo. Amém.
Amém!! Amém!! Amém!! Nossa Senhora a frente. Cuidar da Casa Comun e para todos, mas cadê a consciência?
ResponderExcluirValeu e vale o teu pedido vou me juntar a ti neste momento, obrigada Nossa Senhora de Nazaré