Encontros e despedidas II
Toda
de branco, aquela exuberância na voz, e elétrica que só na presença de palco.
Ela, lá, cantando e eu cá, chorando parece menino besta.
Um
roteiro intensamente emotivo, entrelaçado, para a crônica de hoje, pautado na
cantora Simone.
Ex-jogadora
de basquetebol, dona de um timbre que se equivale em precisão e beleza a uma
cesta do meio da quadra; apareceu pra mim, se não me é errada a lembrança, como
uma Gota d’água plena, irrigadora, inspiradora de emoções. E se estendeu presente,
percolou o encarreiramento traçado pelas décadas de 70 e 80, do século passado.
De repente sumiu, e como o Papai Noel, o bom velhinho do look vermelho,
vermelhusco, vermelhão e das renas voadoras, só aparecia de Natal em Natal, dominando,
com a versão da música de John Lennon, até a programação de rádios cipós nas
feiras.
No
período de isolamento, por causa da pandemia, reencontrei a cantora sem os
enfeites natalinos, nas lives. Foi quando me fiz a pergunta de resposta não tão
fácil. Como vivemos sem Simone tantos anos, como deixamos o talento da cantora
ser reduzido (e até vilipendiado) por causa das intervenções sazonais validadas
pela construção adverbial “então é natal”? Ela é o que é, meu irmão, e tá que
tá presente com tantas e simbólicas canções na história de muita gente. E, diga
lá espelho meu, na minha! Daí as lágrimas enquanto ela cantava “Encontros e
despedidas” aqui no meu escaninho pedreirense. A música é a cara, o corpo e a
alma dos tempos que vivi em Rondônia. Retrata um cenário muito particularmente
verdadeiro que é a plataforma da estação, a vida daquele lugar.
Em
minha jornada por Rondônia, cumpria uma rotina que me permitia sair da mina em
que eu morava e gozar três dias por mês de folga em Porto Velho. Este meu
trajeto (este vaivém) sempre contemplava uma parada na rodoviária da cidade. E
os instantes que eu passava na rodoviária eram tão intensos, tão reveladores,
exerciam uma narrativa imensamente realista daquele momento. A plataforma
daquela estação era, efetiva, verdadeira, incontestavelmente, a vida daquele
lugar. Eram momentos em que eu sentia a vibração da luta diária minha e deste
povo brasileiro que é extraordinariamente, e antes de tudo, um forte.
Enquanto
esperava meu transporte, via gente diferente, porrudos, loiros de olhos azuis,
outros nem tanto, tipos mais comuns, nordentinos, nortistas do meu top,
pantaneiros. Todos em busca de um futuro. Desciam com as tralhas todas. Fogão,
geladeira, camas, um móvel ou outro, filharada, cachorro, gato, um quadro de
santa, aviação para poucos dias e... esperança. Amontoavam tudo num canto isolado
da estação, menos o sonho, que permanecia nos olhos impactando, encandeando. Eu
ali, esperando a minha vez de embarcar, acompanhando. A molecada corria pelos
salões, juntava-se na hora de repartir o cumê, depois largava-se. Até aparecer
alguém. E sempre aparecia. Rondônia naquela época era vetor de migração. A cada
instante vinha um preposto e arregimentava uma ruma de gente para as frentes de
trabalho. Quando cheguei lá em 1983, enquanto o resto do Brasil se batia com o
desemprego. Rondônia chamava gente pra trabalhar, até pela TV e a cada hora.
Quando
a Simone cantou “a plataforma dessa estação é a vida desse meu lugar”, a
rodoviária de Rondônia me voltou na lembrança de palmo em cima. E aí, não teve
combate. Chorei pacas.
Ouvindo
a cantora na Aldeia Cabana, resgato lá de longe, a mesma impressão cunhada por
Euclides: somos, antes de tudo, fortes. Temos condição de fazer um Brasil melhor.
\Pode ser amanhã o “dia da nossa alegria atravessar o mar”.
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