Causos do Círio
Teve
aquela vez que ante o engarrafamento gigantesco da José Malcher, desci do
ônibus e saí em desabalada carreira pela calçada. Meu joelho bichado
reclamando, minha percata escapando aqui, ali; o ar faltando, mas varei na
Praça da República tomado da mais plena emoção, bem em tempo de ver a Santa passar,
na chegada da Fluvial.
E
tem das outras, poucas e boas, já da banda do profano. Foi também num sábado.
Saltei
de um lado pra outro da Presidente Vargas depois que aquele vuco-vuco de motos
passou. Nisso, neste entretempo, o cortejo do Pavulagem já se ia no bem
adiantado do passo em direção à praça do Carmo. Me atrasei na margem
interceptada pelas motos, mas não amofinei. Parti atrás. Foi um dos shows mais
pródigos do grupo. Muitos convidados, lançamento de novas canções. Já na praça,
fui me deixando tomar pela empolgação. Música no ar, gente amiga à beça. O
tempo correu a mil e quando dei fé só restávamos eu, o jornalista Edson Coelho,
uns poucos e a noite como testemunhas remanescentes do folguedo. A notícia,
inclusive era que a Transladação já vinha que vinha. Como voltar pra casa, com
todas as ruas que levavam à Pedreira travadas? Fizemos o último brinde e saímos
à cata de um jeito de tornarmos ao lar. Fora a dificuldade de achar um táxi (não
tinha uber na época e mesmo se uber houvesse, penso que seria difícil destravar
a bom termo). Outro porém, severíssimo encalacre: o cacau, o picholé, o money, o
tutu, o dindim. Passar o dia todo na rua leva todo nosso recurso. Eu estava na
raspa. No pira paz não quero mais. Alentado. Não falei nada pro Edson. Não
queria que ele se preocupasse com minha falência. Fizemos um plano, conseguimos
um táxi além da Tamandaré e de lá, o motora se esmerou em malabarismos e
traçados exóticos de roteiros. Fez um arrodeio estratégico e emergiu na 14 de
março, ali na parte comum ao Umarizal e que era a primeira parada para deixar o
jornalista. Natural que o cerzido executado pelo taxista onerou pacas a
corrida. Edson desceu e quitou a viagem até ali na Quatorze. Eu seguiria para a
Pedreira. Aí foi que foi. Apalpei os bolsos, catei os caraminguás, o montante
não chegou a 20 contos de dinheiros. O que me restou foi me pegar com a Santa.
Estava decidido, dizque, a parar e descer quando o relógio marcasse o tanto de
dinheiro que eu tinha. Mesmo que fosse ainda distante de casa. Segui na
apreensão.
O
chofer entrou na Pedreira, pegou a pista do meio, em boa velocidade. Meus
sentidos ligados no taxímetro. A cada tac (ou tic, ou tec) do reloginho captado
pela minha audição, a visão aferia quantas casas se moviam no totalizador da
corrida. Tensão, fé ardorosa, orelhas esquentando. Quinze paus e chegamos à
feira da Pedreira, confluência da Mauriti. Mais um pouco, cruzando o Josino, já
contava dezessete e uns caroços. Quando entramos na reta final da Aldeia Cabana
eu estava a suar frio, a vista turvando... dezoito e uns trocados. Na hora que
o homem pisou no freio e parou diante de casa, nem olhei pro marcador. Dei tudo
que tinha coletado nos bolsos. Ele assentiu, agradeceu, deu boa noite e eu só
disse Amém. A conta foi abençoadissimamente certa, o tanto absoluto e
irremediável das minhas posses.
Este
ano aconteceu que nem. O mesmo aperreio pra voltar pra casa. Nem uber valendo
os tubos apareceu para nos resgatar após a Transladação. Esperamos que entojamos.
Tá na hora de se pensar com mais humanidade, numa operação de resgate, com
mobilização de transporte em vetores estratégicos, após os principais eventos
da quadra nazarena. Senão o romeiro aqui não dá mais conta.
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