As nuvens da Pedreira
Não,
olha, que mudou, mudou. Antes era tudo certinho. Chovia de dezembro a junho; em
julho ainda aconteciam as pancadas esparsas no decorrer do período; agosto e
setembro eram de dias tórridos; outubro chegava com a chuvinha da santa;
novembro voltava a esturricar o cocuruto e dezembro começava tudo de novo. Hoje
ninguém entende mais nada. O tempo tá um destrambelho só.
Semana
passada dei um pulo na rua, de tarde, para atender a uma precisão. Meio-dia e
pouco e nem estava tanto calor. Comentei com o motorista do aplicativo a
presença de nuvens se formando além e aquém e falei da minha animação em voltar
caminhando, caso o céu continuasse daquele jeito, nuveado.
É
costume antigo bater perna pelos escaninhos da Pedreira e que foi
potencializado nessa pandemia. É regra que, se eu puder realizar qualquer
caminho andando, e se o estirão não for muito ao largo do condado da Pedreira,
o faço. Já ocorreu até d’eu fazer um bate-volta recorde de distância lá na José
Malcher, no pé, e ainda chegar em casa com um super bem acolhido saquinho de
pão. Tem um valor revigorante, de cuidado e atenção com a saúde, a caminhada. A
gente estica o esqueleto, apura o equilíbrio, ativa os sensores, a intuição, respira
com mais qualidade. E ganha um quê de
proteção quando evita contatos sociais, hoje minados de desconfiança, por causa
da pandemia (e dos melindres ideológicos-políticos agudizados).
Eis que
na semana próxima passada voltei andando mesmo. Após fazer a minha missão,
analisei a movimentação das nuvens, a textura, a variação nos tons de cinza e
considerei que o sol ia esfriar. Tirei em uma hora e uns caroços até em casa. E
pensemos cá, em um tempo limite, no trisca. Foi atravessar a porta com o
indefectível embrulhinho de pão e o pampeiro arriou. Causou espanto aquela
chuvarada no final da tarde. Pleno agosto.
O mês é
cantado e decantado como um dos mais quentes do ano. Nessa época é comum a
gente ouvir reclamações dos afogueados. É gente com cara de pupunha nos ônibus,
outros gravando vídeos fritando ovos no asfalto. Dá-se como natural, então, o
susto com o pampeiro. E eu até tentei fazer uma contagem. Se não perdi a
medição, foram pelo menos cinco temporais em agosto, e em alguns casos, com
termos e jeitos de cair raios e alagar a cidade.
Fiquei
curioso com estas reincidências. Aí fui às pesquisas. E é bom, dá um alento a
gente perceber a razão de ser da estatística e dos cronistas (este um aqui, no
caso).
Consultei
uns números. Pus fé no meu taco que aponta para um comportamento diferente do
clima, nos últimos tempos em Belém. É um mecanismo que dá sinais das mudanças
climáticas globais, e que se refletem aqui no nosso quintal, na varanda, no
alpendre, no céu da Pedreira. Não pecamos quando nos quedamos ao estranhamento.
Realmente, o mês de agosto já foi bem diferente. Foi mês de fritar ovo no
asfalto mesmo. No entanto, na vera, as experiências recentes mostram uma
alteração na incidência de chuva.
E a
minha crônica do ano passado confirma esta alteração. Não é um fato que se
percebe hoje. Um ano atrás eu chamava atenção, inclusive para essas nuvens se
movimentando no meio do dia. Céu plúmbeo, algodoado e denso, com se
estivéssemos em fevereiro. É o destrambelho. Uma desordem molhada pleno agosto.
Diferente, muito diferente de antigamente quando tudo era muito certinho.
Chovia de dezembro a junho e se falava pancadas de chuvas esparsas no decorrer
do período... E que passava logo. Vai passar. O destrambelho vai passar.
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