Vô Firmino
Tenho em mim uma troca de energia pra lá de positiva com o Acre. Coisa
da ancestralidade. Saí de lá molequinho sem tino, passei uma eternidade longe, mas
quando dei de voltar, era como se estivesse ido bem ali rapidola tomar de
assalto uma guarnição boliviana. Cheguei chegando. Éraste! Parece uma coisa. Um
conforto, uma empatia, que não senti em outros lugares por onde andei. Um
exemplo que posso dar aqui, foi o que aconteceu em Manaus. Cidade que me era
atravessada. Quando andei por lá, vivia me perdendo. Tudo pra mim tinha que
começar e terminar na Praça da Polícia. Era bater os pés em Manaus e a leseira
recair sobre mim. Às vezes, estava a um passo do meu destino, mas me dava uma
doida, um abirobamento, tinha porque tinha que voltar para a praça e depois é
que eu empinava para novos rumos. Um desnorteio só.
Depois de formado pela Escola Técnica, de ter-me auto proclamado autêntico
e apaixonado paraense papa-chibé, haver conseguido emprego em Rondônia que é
bem ao pegado do Acre, veio a chance de conhecer minhas origens. A terra do meu
papai.
Tinha três dias por mês livre do meu trabalho em Rondônia. Numa dessas
folgas, dei uma escapulida e varei no Acre. Pouco tempo. O ocorrido deu-se em
1983. Tempo pra dedéu. A memória custa a localizar marcas daquela visita tão
curta. Sei que quando desembarquei, nem me abalei assuntando ou consultando
mapas. Tinha só uma mochilinha mesmo, andei um pedacinho pela calçada até uma
parada de ônibus, peguei o primeiro que passou. Não era um acreano. Era um paraense
juramentado. Mas parecia. Tinha uma desenvoltura que só vendo. Não estava
regressando. Lembrança nenhuma guardava da infância que me aproximasse em
termos e modos daquele lugar. Mas atravessei a ponte de ferro pegando aquele
ventinho na janela do ônibus, na maior leveza. Desci no centro, bati perna.
Visitei prédios históricos, o palácio Rio Branco, a praça da Revolução,
descansei ao pé da estátua de Plácido de Castro, almocei mais adiante e no
início da tarde, como se guiado pelo instinto, dei na rodoviária no horário
certinho que saía o ônibus para Xapuri. Era esse o meu plano. Viajar à tarde,
no rumo oeste, pra ver se era certeira a história que dizia o sol não se pôr no
Acre.
Quando cheguei a Xapuri, o sol já havia se posto há um tempo e a noite
era uma verdade concreta e estrelada.
Penso que ante o desconcerto de um encontro inesperado, que acometeu a
banda acreana da minha família, por não imaginar, de jeito e maneira, aquele
paraense desconhecido aparecendo do nada, na calçada da rua da Gaveta, o que me
ocorreu de mais cômoda e pretensiosa interação, foi fazer as contas da chegada
dos sodreres no Acre, para puxar um papo. Meu tio, que a mim me surpreendeu com
extrema destreza, astúcia e inteligência, fez um esforço e chegamos ao meu avô
Firmino, cujo nome dava título à escolinha que funcionava até aqueles dias no
seringal São Miguel. Em tudo por tudo, somando idade dos filhos aqui, tirando a
prova dos nove com a chegada dos netos, ali, casamentos, aniversários, comunhão
e caderno de conta nas lojas de aviamentos, nos demos por satisfeitos em
admitir que meu vô Firmino, vindo da Bahia, fora contemporâneo de Plácido, o
revolucionário e quem sabe, não tenha participado de uns assaltos às guarnições
bolivianas, nas pelejas por um Acre independente?
Tenho em mim, uma troca de energia pra lá de positiva com o Acre. Coisa
do meu vô Firmino.
Sodré, refaz essas contas. Teu avô deve de ter ido pro Acre, mas saído lá do Ceará, ne não?
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