Pira
s’sconde no céu
A
crônica é quase uma fotografia. Só não é de fato o registro do real, porque se
dá no campo mágico da literatura. Aí, se permite um floreado, uma peripécia de
estilo, ou como dizem os teóricos, se deixa levar pela dita transcendência.
Contando
por este lado do retrato, esta semana eu me vi doidinho de marré. Tenho um
blog. Semanalmente posto crônicas antigas, correspondentes ao período do ano
que estamos vivendo. O repeteco tem essa intenção mesmo de comparar fatos, cenários,
pensamentos oportunos.
Na
semana passada, publiquei um texto em que descrevo a trajetória da sombra do
poste, desde o início do ano até o mês de setembro de 2014. Quem pega ônibus no
mesmo ponto todo dia sabe o quanto é importante a gente saber o lugar certinho
para se esconder do sol. Mais com pouco, emboloado nesse cenário astral, menciono
no texto, o encanto da alta madrugada com os planetas Vênus e Júpiter reinando
ali pras matas do agronômico, minutos antes do sol nascer. Epa! Per’unstante.
Aí é que o caldo entorna e achinela emborca!
Não
é que agora, este ano, eu que sou dado a essas paradas, tô de olho no céu e, surpreso,
presencio este mesmo encontro, só que no início da noite! Até 9 horas da noite
ainda dá pra ver os dois planetas brilhando que só eles, descambando sobre a
Ilha das Onças.
Isso
mexeu comigo. É que algumas certezas no universo são irretocáveis. Imutáveis. O
céu que os antigos viam há cinco mil anos era o mesmo de hoje. O movimento dos
astros, aquela mesma caminhada: nasce num canto, morre no outro. A Coincidência
de o mesmo astro, no mesmo período despontar no horizonte naquela mesma
horinha, gerou nosso calendário moderno, ajudou a criar e sistematizar a agricultura,
a prever chuvas ou tempo seco.
Uns
anos atrás, li um livro sobre Vênus. Somente sobre ele. Cercava a história do
planeta pelo lado da astronomia, do misticismo, da astrologia, da mitologia. Um
livro vasto, bom pacas. E que me ensinou que, ao contrário de todos os astros,
Vênus jamais pode ser visto por nós, no meio do céu. Pode reparar. Considerando
a folhinha do ano, e claro, a alternância dia e noite (porque o sol conta, e
ele é o maior exemplo quando plena-meio-dia arde bem em cima do nosso
cocuruto), todos os corpos celestes, uma horinha ou outra, cruzam o meio do
céu. Vênus não. Aprendi como consegue essa mágica, mas não vou contar pra vocês
não. Posso me enrolar. É difícil pacas a explicação. O que acontece então é que
só podemos ver aquele que aparenta ser o maior e mais brilhante ponto do céu,
ao amanhecer ou ao anoitecer.
O
motivo d’eu ter ficado bestinha da silva é que nessa história de universo
imutável, pensava que em setembro, encontraria Vênus naquele mesmo horário de
2014. De madrugada. Ledo engano. Este ano, ao cair da noite, volto meu olhar
para a estrela Dalva. Com o passar das horas ela vai desaparecendo, cada dia
mais baixa no horizonte, até sair da noite de vez para tornar de manhãzinha e
lá pros lados do agronômico. Mas aí não vai ser mais setembro. Acho que entendi
e me aprazo em participar dessa brincadeira de pira s’sconde no céu.
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