Amarga
como o açúcar
Tô
sabendo que tem nave exploradora sendo preparada para descer em uma lua de
Júpiter. Pelas previsões mais otimistas, é lá que a gente vai morar quando isso
aqui estiver pra virar poeira.
Europa
é um pontinho entre outros 69 que ficam dando voltas em torno do maior planeta
do sistema solar. Tem água e pode comportar uma atmosfera que sustente a vida.
O nome, assim como ocorreu com o velho continente, é homenagem a uma princesa que foi raptada por
Zeus. A mitologia grega conta que Zeus para chamar a atenção da princesa, transformou-se
em touro, a levou no lombo para a ilha de Creta e lá ela tornou-se rainha. A
lua de Júpiter tem no nome a fantasia, o sonho, a alegoria.
Mas
nem dá pra gente se animar. Essa viagem não nos pertence. A nova casa já
anuncia a superlotação. É menor que a nossa lua. Como daqui até o embarque, as
relações entre as pessoas estarão extremamente estremecidas, e também, os meios
tecnológicos estarão gravemente comprometidos pelas constantes tentativas de
autodestruição, a disputa para entrar na nave será à dentada.
Estamos
escapando. Nesta última semana, uma guerra mundial se anunciou. A formação de
blocos foi um sinal da dimensão deste conflito. E não é qualquer escrete não.
São nações que detêm a tecnologia nuclear. Alto poder de destruição. Um click
no botão cá, outro lá, e boa parte da humanidade estará habitando o mundo da
poeira.
O
cenário me faz lembrar quando fazíamos a vigília de apoio aos padres franceses Aristides Camio e François Gouriou, ameaçados, no início dos anos 80, de serem
expulsos do Brasil por envolvimento em questões de terra. Em uma noite de muita
reflexão e estudo, alguém fez uma análise da guerra fria, e admitiu que Estados
Unidos e Rússia não se enfrentariam diretamente. Não eram bestas de se
destruírem mutuamente. O imperialismo se encarregaria de apontar o perdedor
virtual deste enfrentamento. Por este pensamento, em tempos atuais, a margem do
mundo viraria poeira e os dois grandes iriam às dentadas para garantir um lugar
na nave para Europa.
Depois
de sábado, fiquei em dúvida.
Como
a viagem para Europa, esta aqui da Terra ou mesmo a outra de Júpiter, para nós,
não está no script, mesmo, vou me proteger na guarda de uma das mangueiras mais
porrudas da cidade e esperar a poeira sentar. Dos males, sei que vou me bater
com a falta do açúcar. Pelo menos era essa a lembrança que meu professor de
inglês, Avelar, tinha da guerra. Estudei com ele no primeiro grau, e olha que
sorte, me bati com ele de novo na Escola Técnica. Era um tipo controverso, duro
e cheio de manias. Tinha, também, seus momentos dramáticos. Às vezes, passava a
aula toda relatando as dificuldades de uma Belém, no tempo da guerra. A maior
peleja era pra conseguir o açúcar. Fazia questão de dar realce à dificuldade de
conseguir açúcar para ele e para a mãezinha. Deixava docemente, transparecer
que a amargura causada pela guerra se dava, mais gravemente, pela falta de
açúcar.
Depois
de sábado, a dúvida. A lua de Júpiter tem água, pode ter atmosfera. Será que
tem açúcar, sonhos, alegorias, fantasias respiráveis?
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