Vinte e cinco por cento
Esta
semana, por indicação de pessoinha pra lá de considerada na paróquia, tomei
contato, pela primeira vez, com uma obra de August Cury.
Não
conhecia, saltava de banda dessas escritas que, dizem as más línguas, são coladas
à fúlgida oratória da autoajuda. Eis que, no entanto, desemaranhado das teias
aconchegantes de Dalcídio, imediatamente, mudei de rumo e aprumei a montaria
para as águas psicopedagógicas de “Pais Brilhantes, professores fascinantes”.
Digo só uma coisa: mal não me fez.
O
autor é profuso, popular. Sou um entre 16 milhões de leitores dele. De primeira
viagem, ainda ressabiado, mas, conhecendo, conhecendo... É frasista. Já topei,
alhures e amiúde com pensamentos dele expressado por pessoas da minha laia.
Não
é exatamente chocante, profético, maldito ou visionário. Realiza construções
apascentadas, quase inertes, do tipo “as grandes idéias surgem da observação dos pequenos detalhes” ou
similaridades concernentes à liberdade ou ao apossamento de nós mesmos como
únicos e universais.
Ganhei o livro de presente num consórcio entre
meu filho e a namorada. Cá comigo pensei: é, como se diz na grande indústria,
uma oportunidade de melhoria. Por certo, não estou agradando. Bem capaz d’eu
estar devendo... Recebi de bom grado o regalo, agradeci, fiz carinhas e bocas
discretas por causa do gênero que não é muito minha praia, pus na fila das leituras
da hora, logo após o Dalcídio e, né que já estou no finzinho!
O conteúdo fala da conduta dos pais, dos professores...
Da carapuça que me coube, fiz anotações, tirei conclusões e, ainda, aludindo à
linguagem dos programas da grande indústria, montei planos de ação.
Em tudo por tudo, concluí que não sou um pai
brilhante. Mas tô na biqueira. Brilho uns 75%, sem falsa modéstia. Perco os 25%
ali na hora do controle das emoções e tal, e tome plano de ação para dirimir
estes descompassos.
Ganho destaque na parte das relações com a
memória. Cury indica que a lembrança não é uma reedição do fato. É, sim, uma
reconstrução da história. Pai brilhante tem que contar história. Oba, neste
quesito, eu corto e aro. Mas já contei, olha, mina de histórias pr’esses meus
meninos. Houve um tempo, que eles eram menores, não tínhamos televisão,
internet, não íamos para as partes (e Cury fala também da necessidade deste
alheamento), eu atava uma rede ao cair da noite, pulávamos todos dentro e haja
contar causos com ou sem causas, da vó Luzia, de quando eu trabalhava no
Carisma e era o menor empacotador do supermercado e do mundo, aquela aventura
nas matas de Rondônia enfrentando tribos de pigmeus, do voo que fiz até a lua
cheia, de tantos dos meus encontros, encantos, das minhas decepções. Tentava me
mostrar, me apresentar para as minhas crianças do jeito escritinho que sou e
eles gostavam, driblavam o cansaço e quando eu pensava que o sono já os
dominava, me voltavam pedindo que eu contasse mais uma da vó Luzia.
Augusto Cury, mal não me fez, muito pelo contrário,
me refez a memória e a realidade do brilho que está a uma insuperável distância
de 25% de mim.
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