sábado, 14 de dezembro de 2024

crônica da semana - a manga que cai

 A manga que cai

Neste instante em que escrevo, nos pertos do dia dez de dezembro, não minto não. Tive que esquentar uma água pra poder tomar banho. Bateu uma sensação térmica pro lado do friozinho aqui em Belém. Pela banda da tarde não encostou nos, até confortáveis, trinta graus a temperatura e agora já escurecendo, me ajeito nos agasalhos para enfrentar os glaciais 26 graus que se anunciam à boca da noite.

Tenho que falar do tempo e dos entremeios, dos escondidos dos fatos e das surpresas instigantes. Mesmo com a voz rouca da resistência. Ainda que enfrentando ecos adversos. Há de se guardar os instantes no abrigo da crônica para que mais tarde as verdades sejam checadas, os desfechos justificados e, que Deus nos acuda e nos perdoe, as previsões sobre as alterações do clima sejam, lamentavelmente, abonadas.

Tenho tudo na ponta do lápis. Desde o dia 30 de novembro que chove com freqüência em Belém. Um comportamento do tempo imediato, diferente dos usuais contados e vividos. Normalmente se espera a chuva mais constante, a partir da segunda quinzena de dezembro. Pelo menos pra mim, nas minhas lidas de rotina e profissionais, as medidas de adaptação ao período chuvoso só acontecem na segunda metade de dezembro. Só depois do dia 15 é que ensaio as providências. Ocorre que esta chuva, agora no traçado imprevisto, me pegou sem sombrinha, ora veja.

Sobre os entremeios, tem o caso relevante da chuva do dia 30. Não aconteceu pelo escrito do costume. Aqui da minha janela virou, mexeu acompanho o ritmo da chuva. Minha referência de intensidade é o chiado no telhado metálico do vizinho; e de velocidade e direção do vento, é um açaizeiro esticado que se impõe como índice ali pras bandas da Perebebuí. E que por linheiro que é, se verga mais ou menos, conforme a força da ventania. Tenho que pelo comum, inclina-se sempre pr’ali, pras bandas do centro da cidade. E este foi o dado curioso e que a rouca voz deve registrar. Naquele último dia de novembro, na hora da chuva, que chiou bastante no telhado do vizinho, o açaizeiro tombou foi pro lado das matas da aeronáutica. A chuva deu ao contrário. Fato raro. Percebi porque marco presença toda vez para apreciar a chuva da janela e nesse dia não deu jogo. O pampeiro vinha me molhar dentro de casa. Tive que fechar tudo.

São os detalhes, os escondidos dos fatos. Céu com nuvens de textura algodoada de manhã, temperatura abaixo dos trinta nas tardes, vento sul e forte de dobrar até embaixo o açaizeiro, nem bem começou dezembro. E vai aí um salve a este açaizeiro, heim. O bichinho verga, vai rés o chão, pros lados do sul, e como observado dessa vez, pro lado do norte, mas não quebra. Um herói de bailado dramático como se estrelasse uma peça clássica roteirizada em chuvas, medos e sobressaltos do clima.

Sem sombrinha, tenho que me conformar e me abeirar pelas marquises até comprar uma que abra bacana sem trançar os ferrinhos. Também, olhar com cuidado os eventos que se contrapõem aos meus conformes, e da mesma maneira, prestar reparo na mudança de modos. A chuva sempre vem dali, vem de carona com o vento que sopra de leste para dentro da floresta. O que maldo é que tanta nuvem pegou carona, que foi se empilhando lá na frente, sofreu um revestrés e voltou. Deu na chuva ao contrário. Do dia trinta pra cá, tomou jeito. O açaizeiro voltou a dobrar pra lá, pra banda do centro.

Deixa estar, que só nessa virada pra dezembro a temperatura média de Belém, se a gente for ousado nas contas, deve ter caído uns dez graus. Assim, no repente. Daí o choque e a piração de esquentar água pra banhar.

Outro choque foi o da manga que cai. Até o início do mês, chegava da caminhada com três quatro mangas taludas, que catava no pé das árvores distribuídas no meu trajeto.  Agora, nem o cheiro. Chego zerado em casa. A galera tá esperta, Acorda cedo, faz a raspa da manga que cai e eu, ó, cheiro na vara do batista.

 

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