Vai pros 15
Eu
era vicici. O custo era ter um jogo no Baenão, de noite, que me unia à patota
do trabalho e tirava pra lá. O prédio do antigo supermercado continua no mesmo
local e quase sem alteração. O Evandro Almeida é que passou por algumas
modificações (não tem mais aquela área grande do lado da Almirante que nos meus
tempos de menino boleiro, recebia uma carrada de moleques de tudo quanto é
canto para os desafios no campinho de areia que existia ali. Mesmo espaço mais
tarde cedido para bingos, depois, Carrossel, depois...).
Tinha
12 anos e já trabalhava de carteira assinada, no antigo Carisma e, no meu
tempo, Pão de Açúcar. Desenvolvia a importante função de empacotador. Àquela
época, uma atividade ambientalmente correta. Não se usava sacos plásticos. As
compras eram, pela regra, acondicionadas em paneiros. Dois paneiros encaixados
e forrados no entre espaço, por uma folha de jornal. A pedido do freguês,
normalmente alguém a caminho da rodoviária, fazíamos uma embalagem para viagem,
reforçada em caixas de papelão e bem amarradinhas com barbante sisal 2mm. Minha
jornada era dura para um pré-adolescente que estudava no turno da manhã. Pegava
às 3 da tarde e levava até às 11 da noite. A carga horária semanal ainda exigia
trabalho aos domingos até meio-dia (mais até, porque depois de fechada a loja,
ainda tínhamos que lavar o salão com sabão e escovão).
Eis
que me bateu esta cena de exploração infantil, justo por causa dos jogos no
Baenão. Era de confronte e a nossa saída do trabalho, não raro, coincidia com o
finzinho das partidas. Como hoje, naquele tempo o transporte público era
precário e depois das 11 horas, contávamos só com o cristo. Para dar um adianto
na evacuação, quando faltavam 15 minutos para terminar o jogo, a administração
do estádio abria os portões para as primeiras levas de torcedores que preferiam
sair mais cedo. Era o nosso momento. Ainda com os uniformes do supermercado,
ficávamos brechando uns lances aqui, ali, do lado de fora, pelos vagos do
portão. Quando abria, enquanto a turma saía, a gente entrava, no contra fluxo,
para ver os 15.
Agora
inventaram essa marmota de jogos em horários diferentes, estranhos, sem
combina, sem ação. No tempo que eu trabalhava no Pão de Açúcar, tinha aquele
horário certo, acabava antes da meia-noite, a gente ia pra parada esperar o
cristo.
O
estádio era bem na biqueira da loja que eu trabalhava. Até me dava com alguns
jogadores do Remo, mesmo sendo bicolor. Eram clientes, pagavam uma Fanta,
alimentavam na gente a esperança de um dia sermos craques da bola. Também,
sendo perto e nos dando os 15 de ganho, tive a sorte de ver cracaços em campo.
Zico, Jorge Mendonça, Roberto Dinamite, Nelinho, Rivelino... Os visitantes de
Paramaribo, o Moto-Clube. E ainda admirar os de casa. O motora Alcino que
tantos nos fez raiva, Marinho, Cuca, Aderson, Amaral, Dico... Todos
atravessavam a Almirante para umas comprinhas, de repente, também. O elenco do
bicola, de vez em quando abeirava. Eu tinha um colega de trabalho que era primo
do Edmir, lateral do Paysandu. E olha, a bola era coisa de família, o moleque
meu colega jogava muito. Diga-se que vi o Edmir pegar um sufoco do Danival, ponta
esquerda, em um jogo com o Atlético Mineiro, no Baenão, em que o Reinaldo ficou
na reserva. Entrou no segundo tempo e... Destruiu. Era um monstro de talento.
Agora
por esses dias o melhor do Norte, o Campeão, primeiro e único, dos Campeões,
deu de jogar seis e meia da tarde. Na hora que a gente ainda tá no barco, a
caminho de Belém. Uns amigos torcedores mais empedernidos se lamentaram por não
conseguir chegar a tempo. Um mais inquieto fez as contas e concluiu que
chegaria já no finzinho do jogo não valeria a pena. Lá da outra poltrona do
barco, dei meu pitaco: vale sim, vai pros 15. Agora com a instituição dos
acréscimos, contam ainda jogo pacas.
Delícia de texto,
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