Saudade do jambeiro
A
reunião da família no domingo das mães, não foi a primeira sem ele. O encontro
foi só mais um acontecimento em que a ausência do jambeiro para nos dar sombra,
conforto e nos proporcionar a mais ampla interação na razão de todo mundo junto
de uma só vez, causou impacto; foi mais um dia em que a falta da copa robusta, a
ramada simétrica do jambeiro nos abrigando inteirinhos no quintal, foi muito
sentida.
Seguramos
o quanto pudemos, o jambeiro em pé. Com podas, retiradas de parasitas, adubos
na base. Mas chegou um tempo que não deu mais. O caule extremamente
comprometido, atrofia do xilema e sobrepeso da copa estavam em tempo de jogar a
árvore em cima da gente, ou pros lados do vizinho, o que nos causaria um
indesejado conflito diplomático. Tinha ocasião de chuva com vento, que eu
ficava na porta só observando o movimento pra lá e pra cá e ouvindo o
renque-renque daquela árvore tão querida, sofrendo nos estertores, e eu fazendo
figa pra ele não tombar. Até que um dia, em uma das podas, o operário ao se
apoiar no tronco para um movimento de corte, viu o braço avançar num puro oco e
a assustadora dispersão de um exército de tachis. Não havia salvação. Esperança
nenhuma havia. Cortamos no rés e destocamos a raiz, cheios de dó.
Agora,
a bom a gente penar sem a sombra do nosso jambeiro. Não dá nem pra comparar o
antes e o depois. Muito mais quente. Muito diferente em tudo. O que notamos é
que atualmente, montamos a mesa, cada um faz seu pratinho e se entoca. Nada de
cortar uma prosa no terreiro com o este solão torrando o cocuruto. Caiu que só
o divertimento sem a reunião que se prolongava pela tarde acompanhando o
caminhar da sombra do jambeiro sobre o quadrado do quintal.
Os
efeitos que percebemos a cada encontro comemorativo da família, no consagrado
quintal das festas é uma versão numa escala de bairro, de rua e de memórias, do
que em dimensões planetárias podemos causar, quando suprimimos elementos de
equilíbrio e controle do ambiente.
Eu
já tinha um exemplo do poder arrasador dessas alterações.
Foi
numa viagem de campo da minha turma de Geologia. Fizemos a campanha toda pelos
arredores de Capanema e Bragança. No último dia, o professor agendou o almoço
na praia de Ajuruteua. Isso, lá por 2004. Havia uma intenção naquela esticada à
praia, além da comida e de um mergulho rápido antes de voltarmos pra casa.
Paramos na estrada e o professor perguntou se alguma coisa na paisagem nos
chamava a atenção. Foi um choque. De um lado do caminho, o mangue era vivo,
robusto, farto de água. Do outro, secura total e desolação. A estrada que era
vista como uma conquista para a região, era responsável por aquele atentado ao ambiente.
À época, fiquei remoendo aquele cenário e me impus não abrir sequer uma valeta
debaixo do beiral de casa, com medo que, o que eu fizesse na inocência no meu
cantinho, refletisse em catástrofe em algum espaço outro sensível do planeta.
Se
após a retirada do jambeiro a gente plantasse outra árvore de potencial
frondoso, por esses dias a gente já teria uma nesguinha de abrigo contra o sol.
Não agimos. Contamos com o Jucá que, não canso de dizer, é tipo Deus no céu e
ele no nosso quintal. Serve pra um tudo. Só que tem as folhas miudinhas, galhos
franzinos, envergadura discreta. Pra essa missão de sombreamento e frescor, ele
não delega não.
Ante
esta catástrofe que ocorre no Rio Grande do Sul, a gente ouve cada presepada.
Em ocasião recente, dei com uma ‘opinião’ que desconsiderava a ação humana como
agente das transformações climáticas. Opinião que não admite, como o fiz há
alguns anos, e ratifiquei agora, que o que agente faz de inocente ou de má fé
aqui, pode resultar num desastre acolá.
Nossas
confraternizações em família não são mais as mesmas desde que desequilibramos o
microclima do nosso quintal com a supressão do tão amigo e querido jambeiro.
Nenhum comentário:
Postar um comentário