A copa das copas
Dizendo
assim, hoje, é difícil acreditar que houve na história do desporto paraense, um
torneio de futebol de considerável envergadura, que mobilizava penca de times
de bairro, aqui de Belém (não sei se ocorria em outros lugares) e que era, ora
mire e veja, era patrocinado por uma marca de cigarro.
A
copa das copas foi a Copa Arizona, com certeza.
Um
evento esportivo, alguém consegue imaginar, inspirador de corpos atléticos e
saudáveis, bancado pelo inimigo número 1 do pulmão?
Pior
que era. Um senhor evento. E que, a bem da boa prosa, contava com uns quantos atletas
que, perfeitamente integrados à filosofia do patrocinador do torneio, não davam
essa bola toda à ortodoxia do corpo são e mente sã.
Ao
contrário do `Peladão, que tinha o Fuzuê, o Lá vai a bola... famoso também na
época, que era descalço, jogava-se a Copa Arizona de chuteiras. Havia uma ordem
na organização. Arbitragem contratada, todos os times uniformizados e com
equipes técnicas e de apoio bem compostas. Os jogos se realizavam no gramado
bem cuidado do campo da Escola de Educação Física. Era bem bacana a competição.
Dava alegria e revelava talentos. A movimentação marcava o fim de semana. Aqui
da Pedreira, eu lembro bem do Asas do Brasil nos representando em mais alto
nível. Não tenho certeza, mas me parece que o Natal também fazia uma ferida nos
confrontos. Os jogos se realizavam durante o dia todo, cobriam dois, três
finais de semana com partidas disputadíssimas até chegar à grande final.
Eu
e minha patota da Mauriti éramos fanchões na torcida. Enquanto tinha jogo,
estávamos lá na arquibancada da Escola, que dá pros lados da Vileta. Folgávamos
em pegar detalhes. Muitos dos jogadores da Pedreira, conhecíamos, jogávamos com
eles nos segundos quadros da vida em treinos que antecediam o torneio, pelos
campos do Asas, do Trabalhista, do Sacramenta. Tudo passado na casca do alho.
Só nó cego. Eram boleiros dos melhores, mas avessos a disciplinas ou condutas
espartanas em favor do sucesso. Ali pelos arredores do Areal, quando acabavam
as partidas de preparação, era rápido que formavam os grupinhos para animados
folguedos em mesas dos mais escondidos botecos da passagem do Arame, ou da
baixa da Dr. Freitas. E tome um gole gelado, uma branquinha, o maço de Hilton
no bolso e otras cositas más até altas horas da madruga. Minha turma como era
menor de idade e mais da bandalha e da molecagem do que dos proibidos e
desaconselháveis, peruava ao largo nas primeiras horas da noite, identificava
os craques mais saidinhos e depois ganhava o rumo de casa porque a mãe marcava
em cima. Deu dez horas...
O
que conta é que no dia do jogo oficial lá na Escola de Educação Física,
sabíamos o que as feras haviam aprontado pela baixada.
E
nem era segredo. Lá mesmo, no calor da hora, pleno jogo correndo solto, numa
batida de lateral ou no intervalo do primeiro para o segundo tempo, flagramos
mina de vezes, nossos ídolos, chegando às bolsas capangas, apanhando de lá o
maço de Hilton, Arizona ou um Gaivota, que seja, e saindo relaxado à beira do
gramado, ao prazer da boa tragada. Quando não, dando goles clandestinos em água
que passarinho não bebe. De volta ao jogo davam show, desarrumavam as táticas
das onzenas adversárias mais afinadas.
O
comercial do cigarro, que tinha cenário de um deserto avermelhado, cavalos porrudos
e caubóis com cara de pupunha dizia que os homens se encontravam no Arizona.
Minha patota se encontrava todo fim de semana, na arquibancada da Escola de
Educação Física, enquanto durasse a copa das copas. A gente não tinha cavalo.
Se batia da Pedreira para os longes do Marco era tirando no pé mesmo.
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