Férias na escadinha
Alguns
minutos de espera por uma carona me fizeram voltar muitos anos no tempo. O
ponto de encontro era a escadinha do cais do porto, na praça Pedro Teixeira.
Enquanto, minha carona não chegava, dei umas voltas para abelhudar a produção da turma de pescadores que àquela
hora da noite, mariscavam aproveitando a maré enchendo e a noite sem chuva.
Revisitei
os tempos de traquinagens e peraltices de moleque rueiro, que eu era. O custo
era a batida da campa anunciar o fim da última aula e as janelas das férias se abrirem
amplas, gerais e irrestritas à nossa frente, que num instante, a gente inventava uma
pescaria na escadinha.
Antes,
claro, vencíamos o asco, o dito nojinho e nos embrenhávamos pelos estirões de
terra preta que dominavam os quintais da Pedreira, em busca de minhocas para
isca.
Mamãe
sabia da aventura. Recomendava. Avisava sobre os ventos fortes nos finais de
tarde, sobre o banzeiro certo quando o sol esfriava (o que quer dizer que, Deus
te livre e guarde de descer a escadinha para desengatar linha. Esta arte ela
não permitia de jeito e maneira). Nestes termos, me dava a bença, e eu estava
liberado. Podia ir. Não tinha muitas opções para as férias. A pescaria na
escadinha era, por certo, um divertimento, mas, também, me ocupava, me fazia
desprezar aquela trava de menino besta de não pegar em minhoca, em terra
molhada. Tirava de mim o medo de varar as cercas da vizinhança, de andar
descalço pisando na terra nua, no úmido da beirada daquele igarapé que corria
por detrás das casas ou na lama vasta quando ele se espraiava no (i)gapó.
Divertir,
a gente se divertia a valer. Folgávamos com aquele deslumbramento, com aquele
transe provocado pelas cores que modelavam o horizonte, no arrebol. Agora,
pescar, não me ocorre ter fisgado um único peixe.
Divertir,
nos divertíamos às pampas, com o vento que soprava com mais de mil de encontro
a gente, e dava aquela sensação gostosa de muito ar, de muita vida, de um mundo
de alegrias, distante, agitado, mas amistoso
vindo nos visitar. Por outro lado, pescar, pescar mesmo, puxar um
peixinho daquele jeito de fazer um risco na água. Lembro não.
Na
minha história de escadinha, não puxei um único peixe. Até que sentia o
bichinho beliscando minha minhoquinha, mas patetava, perdia a puxada e ele
fugia. Por outra, a minha linha engatava nas pedras (mamãe não deixava eu
descer. Ralhava), eu quebrava bem na mão, e ficava sem, só ‘amucegando’ os
outros moleques.
Quando
as aulas voltavam, em agosto, todo mundo contava história de veraneio em Salinas,
Marudá, Algodoal. Eu fazia a minha redação na mais pura mentira, botava pra
chulear na imaginação (talvez venha daí o pendor para crônica). Dizia que tinha
passado o mês todo em tal lugar maravilhoso assim, assim, com praia de água
salgada e muitos coqueiros na areia. Mas quite! Pintava os canecos mesmo era na
escadinha.
Na
minha abelhudação, enquanto esperava a carona para casa, lembrava dessas coisas.
E vi que os pescadores, naquela noite, até que estavam puxando. Uns peixes
gititos assim, mas enfim...Puxando e se divertindo pacas.
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