Sem fôlego em Mosqueiro
Nunca
fui de me afastar de casa. Era amamãezado de dar entojo. Meu negócio era ficar
pendurado na barra da saia da mamãe. Não arredava o pé. Ficava só por ali, arrodeando.
Uma ou outra ocasião que arredei, fiquei sem fôlego em Mosqueiro. Uma vez
porque chorei muito; outra vez, fui querer dar um beijo numa pequena dentro
d’água e me afoguei...
Eu
era bem pequenino por aqueles dias distantes que nem ponte havia atravessando o
Furo da Marinha. Minha tia Fabiana, de malas prontas para a ilha, num pé e
n’outro para veranear na casa de uma amiga, me vendo por ali zanzambestando
pelos corredores da casa sem ter um quê de arte ou dever para fazer nas férias,
resolveu me levar para o passeio. Até a viagem pela baía do Guajará a bordo do
emblemático Presidente Vargas, eu tava que tava um amor. O navio, de popa à
proa era de todo simpático, tinha a marca da tradição, carregava uma vuca todo
Julho para as praias do Mosqueiro, era íntimo dos usuários. Um navio popular de
uma envergadura nobre. Oferecia eficiência na navegação, prazer na contemplação
de belas paisagens e... além dos termos e tantos rotineiros, nos oferecia
interações e sensações que aos tempos longínquos e ásperos, resistiriam. E eu,
ó, curti pacas aquela hora e um pouquinho singrando o leito deleitoso da
Guajará.
O
custo foi eu bater em terra.
Quando
me vi não sei donde de distância longe da mamãe, com a possibilidade de voltar
contando unicamente com um navio agora não tão simpático e que já se afastava
sem dizer um tiau; quando dei com um mundo de água na minha frente engolindo
pelo menos três pontos cardeais e me tirando as referências mínimas para onde
ficava a Pedreira, a nossa casa com tajás-curados vingando ao longo do chagão;
Quando tornei para um tempo certo de não ter mamãe por perto, emburrei bem
emburradinho. No trapiche ainda, bateu o banzo. Mas tá, vá lá que seja, peguei
na mão da tia e ensaiei uma concordância comigo mesmo de aguentar e aproveitar
a praia. Mas quite, quando chegamos na casa em que íamos ficar, apesar de
conhecer as pessoas que estavam hospedadas lá, os meninos (e ponha menino
nisso), os donos da casa, estranhei. Eram, a maioria, todos vizinhos ali da
Marquês, Mas não teve jeito que desse jeito. Minha tia nem tinha atado minha
rede direito e eu já começava a ficar sem fôlego.
Me
lembro benzinho. No outro dia, café tomado, descemos para a praia. Aquele
mundaréu de moleques. Todo mundo arrumando um divertimento, se arranjando numa
brincadeira e eu, macambúzio, solitário, sofrendo com saudade da mamãe. Da
feita que cheguei na praia, sentei na areia, cruzei os braços sobre os joelhos,
baixei a cabeça e comecei a chorar. Endoideci minha tia com aquela nostalgia
choraminguenta. E não tinha picolé, chope de groselha, convite para virar
carambela no raso d’água, nada, mimo, aventura nenhuma que me resgatasse de
tamanha tristeza. Lembro que no caminho para a praia a gente descia pisando em
taperebá, de tanto que havia por lá, e são os traços daquele cheiro provocante,
daquele amarelo esmigalhado matizando o chão cinzento que recriam dentro de
mim, hoje, a única sensação boa que ficou daqueles dias na praia. Eu era um
instantezinho assim feliz roendo, pisando os taperebás, cheirando os taperabás
pelos olhos.
Acabei
com o espairecimento da minha tia. Passou o primeiro dia, o segundo e como ela
viu que todo dia eu perdia o fôlego de tanto chorar, juntou nossas coisinhas e
batemos de volta para casa.
De
perder o fôlego, perdi também, já mais taludinho, naquela presepada de beijar
embaixo d’água, mas essa parada uma outra horinha eu conto.
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