Linha de passe e confusão
Cruzamentos
de informação, né. Os ‘do contra’ suportados em fieiras e mais fieiras de
argumentos dos mais incisivos para contestar a copa. Os ‘a favor’, partindo
para a deslealdade, atingindo o coração. A paixão pelo futebol. Tô confuso,
estudando cuidadosamente os fatos, os tratos e contratos.
Aqui
em casa, sou minoria, meus meninos que aderiram à turma dos “manifestos”, dizem
que vão me amarrar no pé da mesa para me tirarem a possibilidade de me apossar
do controle e sintonizar a TV nos jogos. O clima tá tenso, precisando de
mediação. De Amarantinha nem maldo, desde que o Lucas, ex São Paulo, foi
excluído do elenco, desistiu da seleção. Argelzinho, um menino que a vida toda
só teve a bola como presente nos dias que eram de ganhar presente! Éras-te, deu
uma guinada radical. Tá no clima de “copa é minha pororoca”. Tirando uma onda
com o espaço-tempo, já que hoje é sábado e a bola já rolou para o Brasil, é
incerto se vi o jogo ou não, na quinta. Consideremos que um mistério há de pairar
sobre o desfecho de tão hamletiana contenda. Ser ou não ser um torcedor
apaixonado, eis a questão. Ouço meus meninos e a ruma de gente do contra ou atendo
ao puxavanco involuntário do meu pé que vem responder aqui no meio do peito e
que me atiça um encegueiramento destrambelhado pela bola?
Meio
campo congestionado este mês de junho. Anarriês, alavantus, balancês,
formigueiros, e olha a chuva no fim da tarde!
Assim,
como o pai da noiva me pego desconfiado. Não vou tomar partido deste ou daquele
movimento. Se alguém quiser a minha opinião saio pela tangente afirmando que
não sou contra nem a favor, muito pelo contrário.
Agora,
pelo que se torna e pelo que se deixa, tenho que admitir que é muita crueldade,
para mim que sou chegado a uma bolinha, ver este sufoco medonho em torno da
grande área da vida. É uma pena que um país que fez a sua revolução, mesmo que
timidamente, lutando na zona do agrião, se ache apartado de gozos e
comemorações; uma frustração do calibre daquela de se encontrar cara-a-cara com
o gol e chutar a grama, tropeçar e ainda cair de quatro. Penso assim, porque
não podemos esquecer que ao trilhar do primeiro apito, o futebol era um esporte
das elites. É de domínio histórico que os negros descidos dos morros esbanjando
ginga e jeito não tinham vaga nem na grade dos times formados pelos brancos bem
nascidos do asfalto; e para ganhar vez num segundo quadro que fosse, conta o
cronista Mário Filho, tinham que usar touca para esconder o cabelo enroladinho
e mascarar-se com o branco do pó de arroz. Elevar-se sobre a ignomínia do racismo
com talento e graça, nos alteou a estima. Rompemos os grilhões estufando as
redes. Uma revolução entre as quatro linhas, ora, ora, mas...
Não
podemos nos ufanar. Nossa revolução precisa ser atualizada. Concordo com meus
meninos. O país tem necessidades graves e imediatas. Considero apenas que não
são imediatas de hoje. Ano após ano, governo após governo, nos afundamos em
mazelas. Aceito também a afirmação de que o futebol é um lenitivo. Causa um
alívio enganoso no povo (o que também não é de agora, e digo até mais, é quase
certo pra mim, que o futebol tal como está submete-se a um sistema monstruoso,
global, descomunal. Ilude). Mas ora bolas, como o futebol, a religião, o Agarol
e carnaval são instrumentos fármaco-sociais tidos e havidos como o ópio do povo
(exceção feita, com justiça, ao Agarol). E pelo amor de Deus, eu já tô me
guardando pra quando o carnaval chegar. Ou não vai ter carnaval também?
A
mim, antes da dúvida, reina a impressão de que a copa legal mesmo é na África dos
outros.
Gostei Raimundo.
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