A plataforma desta estação é a vida
Eu
que nem creio, tá bom, tá bom... não sei se creio. Tenho em mim ainda uns
toques salesianos poderosíssimos. Eu que duvideodó, tô na paz com o bom pai
pela graça dos reencontros.
Amigos
a gente não escolhe, nem encomenda. Estão nas frestas adamantinas da história,
nos veios enriquecidos de ouro e vida. Não têm roupas coloridas, não se
maquilam ou se enfeitam. Por outro lado, as sólidas amizades mostram-se em uma
indiscrição silente, em índices reveladores, grafismos sinalizadores de
coraçõezinhos e mãos dadas. Exibem-se em pistas atraentes, como se apontando
caminhos atapetados de chocolates finos, leite e mel. Reluzem paz pelo céu
infinito, pelo mar distante, além dos entendimentos e lógicas.
As
forças mais legais, forjadoras de bem e bom da natureza arquitetam esbarrões
oportunos, cruzamentos de afinidades, de curiosidades mútuas, e as relações, as
convivências vão se tornando adocicadas, cheias de energias e comoções. A
eletricidade circula pelos poros, pela mente e ativa a simpatia, a admiração, o
querer estar junto, a ânsia por uma partilha de opinião, de conhecimento, o
desejo de um bom papo a toda hora... uma certa e saudável dependência, o
alheamento de outras seduções, a fidelidade, o mimetismo, a leitura de
pensamentos um do outro, as reações paralelas, o olhar igual; introdução,
desenvolvimento e conclusão em idênticas passagens, como o lembrete abrigado na
manga da camisa de um ginasiano descolado.
Inevitavelmente,
a vida avança. Ocorrem os lapsos, os apartamentos. Encantos, inspirações vão se
distanciando no tempo e no espaço deste Brasil imenso.
Algumas
amizades distam nas eras ou, de outra forma, superam o passar dos anos
inquebrantáveis, adensadas como as rochas mais resistentes, apesar das
intempéries que, olha, olha, são muitas. Por vezes, os longes se manifestam em
imagens de um cenário doméstico remontando uma pilha avermelhada de edições
antigas da revista Superinteressante, walkie talkies sem pilha, headphones com
chiados roucos em disposições caóticas sobre um estrado na calçada da feira da
Pedreira. E folguedos juninos protagonizados por silhuetas matinais pardas
desenhados em coreografias de esquina. Ou em um céu minado de estrelas e
povoado de um jeito que mal dá pra identificar o nicho das Plêiades do jeito
aquele que o mestre ensinou. A imagem de um barranco de aspecto sedoso
rondoniense, e a dinâmica criadora de um magma viscoso, lento e diverso
ascendendo do fundo da Terra, também trazem a idéia de afinidades químicas,
emocionais, intelectuais cristalizando respeito, carinho, benquerença.
As
amizades vão acontecendo, criando forma, se ramificando e ganhando envergadura,
tal os rios que se estendem a bocados. Vingam calçando as vias dos tempos com
camadas rijas de inspiração, admiração e saudades.
Desde
o ano passado, quando passei as férias em Minas Gerais e reencontrei dois grandes,
imensos amigos do tempo da mineração em Rondônia, minha graça foi, ó, lá pra
cima. Superou o milhão do Hulk. Confirmando que é certo e justo um amigo ser
bem mais valioso que umas cifras na casa do milhão em Reais. Este ano,
reencontrei a família Moscoso, no Rio de janeiro.
As
palavras têm um peso muito pequeno para significar o meu contentamento com este
reencontro. Nossas famílias, nossas crianças, o menino que carreguei no colo.
Os compromissos éticos e mundanos que mantemos ativos. A cuia de tacacá que
levei de Icoaraci para Rondônia há quarenta anos e que até hoje orna uma
prateleira de destaque na decoração da casa deles.
Nos
reencontramos depois de tanto tempo! Entendendo da mesma forma, a quantidade de
futuros que se encontrava naquela rodoviária de Porto Velho. E que nos chamava
a atenção. A plataforma daquela estação era o início de muita coisa.
A
plataforma dessa estação amizade é a vida. É o nosso lugar. Salve!
Que o bom deus cuide e zele das minhas amizades