sábado, 6 de dezembro de 2025

crõnica da semana - chuva de granito

 Chuva de granito

Já pensou uma chuva de pedras na cabeça da gente?

Há algum tempo, revelei aqui um dos meus imperdoáveis pecados, de tal forma imprudente, que até hoje me consome. Tá legal, tem o desconto que eu era um estagiário iludido, deslocado da cidade grande para os sertões de Rondônia, um técnico de nível médio metidão com o status, além de peão um tantinho, que a carreira me oferecia. E que operava com os conhecimentos importantes, porém básicos, adquiridos no curso da Escola Técnica. A vítima foi um membro da equipe que se destacava como líder de campo. Em um dos relatórios, nos apresentou uma amostra e se referia a ela como sendo de ‘rochas graníticas’. Presunçoso, fiz a correção. Não reconhecia denominação generalista como aquela. Conhecia sim, uma rocha chamada granito e era esta, específica, a notação que ele deveria usar. Um erro bruto, pétreo.

Mais tarde, bem além dos meus tempos de estagiário, já na Universidade, me aprofundei e constatei que existe realmente um grupo de ‘rochas graníticas’ que têm gradação mineralógica e conforme a proporcionalidade entre os minerais recebe, aí sim, um nome específico. Um deles, granito. Então, tentando a remissão, mando um ralho para o estagiário cabeça-dura que fui: dentre as rochas graníticas, que são parecidas visualmente, uma das composições é o granito. Varia a composição, ganha outro nome. O nosso líder, lá em Rondônia estava era certo. E eu era um bestão querendo ser o que a folhinha dos anos 80 nem ensaiava.

O tal granito é uma rocha constituída de três minerais principais. Quartzo que atualmente encabeça as tecnologias de fibra ótica, além de se travestir no nosso querido copo de cerveja; o feldspato, pouco conhecido por nós aqui do norte chuvoso, mas que é o príncipe do universo mineral; e a mica, que tem a forma de placas e que pode ser encontrada nas nossas lembranças como uma pecinha encaixada dentro dos ferros de engomar de antes (não sei agora, nunca mais esbandalhei um ferro pra ver o que tem dentro e, diga-se, uso muito pouco o ferro de passar. Sou da turma dos amassadinhos). Todos com densidade ali, ali, beirando o triplo da densidade da água.

Uma chuva de granito seria mina de pedrinhas mais pesadas que a água, caindo no nosso cocuruto.

Minha avó contava que lá no Acre, tinha presenciado uma chuva de peixes. Pelo sim do conto e o não do contado, entendia aquele trancoso como intimidação, história pra dormir aos ‘arrupios’. Com o tempo, observando a formação de trombas d’água, reconheço ser até possível um ou outro peixinho despencar das nuvens. Agora, granito! Nananina.

Pior que é comum a gente se referir às chuvas de ‘granizo’, aquelas que vêm com pedrinhas de gelo, como sendo de ‘granito’. Às vezes por impulso, distração, troca simples de consoantes e até convicção (sem provas). Vai da situação. Confusãozinha feita principalmente pela nossa gente daqui, do norte, pouco acostumada a este tipo de precipitação (Na minha vida, só vi uma aqui em Belém e outra em Rondônia. Nas duas, saí pra rua, menino péssimo e sem medo que era, para catar as pelotinhas de gelo).

Não é raro o atropelo na pronúncia e também na escrita.  Fenômeno da língua identificado como paronímia. São aqueles deslizes provocados por palavras parecidas. Eu tenho pavor de uma penca delas. Sempre me traem. Óbidos e óbito. Comprimento, cumprimento. Para aludir à palavra tráfego, paro diante do semáforo e penso antes de seguir, para não desviar para o tráfico. De emigrante e imigrante, nem falo nada. É bom não dar asas para esses destinos.

Recentemente, nuvens densas e agigantadas provocaram chuvas de granizo no sul do país. Com intensidade potencializada certamente pelo aquecimento global.

Dias depois, topei com um vídeo na internet em que uma especialista em ‘assuntos de tudo em quanto’ afirmava que aquela chuva destruidora fora fabricada pelos comunistas. Fosse chuva de granito, eu até acreditaria.  

 

 

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