Sem paneiro pra fazer fogueira
A alegria
quadrilheira ainda retine. O batalhão do Pavulagem também estica a brincadeira
e arrasta o povo amanhã, mas o certo é que Junho foi-se deixando saudade. E uma
inquietude: tenho me batido para entender a razão de santos tão distantes no
tempo, na legitimidade e no espaço serem homenageados, todos juntos, nessa
época. Assim, de prima, não tem muito a ver.
Há,
porém, a surpresa. O João junino, morria e não sabia que era o Batista. Cria
que fosse o outro, o evangelista. Mas é o pregador do deserto. Também não sabia
que era santo. Pra mim, era profeta, aquele que pedia o arrependimento e
preparava o caminho do Messias. Talvez pela minha ignorância, não conheça
santos profetas, nunca ouvi falar num santo Isaías, por exemplo. Sobre São João,
então, minha dúvida cai sobre a legitimidade, embora o considere o grande
profeta do advento.
Quanto
a Pedro, sem dúvidas. É pedra. Fundador da igreja (que canoniza). Tem lá seus
passos ligados aos de João. Devem ter atravessado o Jordão em caravanas de
fiéis ou de pescadores. É santo dos mais confiáveis. Tem a chave do céu e aqui
na Pedreira, legitima-se realizando o milagre da multiplicação dos peixes todo
dia 29 de junho. Já fui pra fila muitas vezes pegar meu quinhão de Piramutaba,
graças a Pedro.
Taí,
tirando a categoria de profeta atribuída a João, entre estes dois, há a
coincidência da época. Isso explica um pouco a comemoração casada. Agora, e
Antônio?
Antônio
era Franciscano e nasceu mais de mil anos depois de João e Pedro. É santo
canonizado pela igreja e pelo apelo popular. Esteve frente a frente com
Francisco de Assis e foi frade pensador. Eis uma contradição bem marcante entre
Antônio e os outros dois homenageados. O tempo (além da fé inspirada já na
igreja fundada por Pedro, e num jeito de vida incentivado por Francisco. Foi
movido por estímulos diferentes, na forma, daqueles que tocaram Pedro, o
pescador; e João, o profeta).
O que de
interessante descobri é que esta comemoração envolvendo os três personagens do
cristianismo está ligada ao solstício. Em junho, ocorre o dia mais longo do ano
na Europa. Pra gente aqui da beira do Amazonas isso conta pouco, agora, se
imagine numa cidade em que a noite comece lá pelas 11 horas. Isso é fascinante.
Os antigos pensavam assim. Aquele dia especial trazia o início do verão, novas
esperanças, possibilidade de realizações, padrões para a agricultura. Era um
dia consagrado. A revelação de um cuidado vindo dos céus. Creditaram então este
acontecimento aos deuses. Criaram uma mitologia regente da natureza.
Com a
ascensão do Cristianismo, a mitologia primitiva foi substituída pelas crenças
cristãs. Os deuses, por santos. O mês de junho continuou sendo um mês de
revelação, mas agora, dirigido pelos santos católicos. Para iluminar as
esperanças, como o sol do solstício, a igreja agrupou Antônio, João e Pedro, que,
conta-se, nasceram todos no mês de junho (isso explica a homenagem aos três,
juntos). Não encontrei registros de São Marçal e também não encontro mais
paneiros pra fazer fogueira, pela cidade.
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